12 de maio de 2010

Carta da OAB sobre as propostas de alteração no Plano Diretor

Ilmo. Sr. Presidente da Comissão de Sistematização
Da Câmara Municipal de Valinhos.



Ref.: Apreciação das Mensagens e respectivos Projetos de Lei de nºs 150/09 e 151/09.




        A Comissão de Meio Ambiente da Ordem dos Advogados da Subseção de Valinhos/SP, vem, por meio dessa, sobre o assunto em referência, apresentar sua manifestação, conforme segue:

        Iniciamos nossas considerações com o exame da Mensagem nº 88/2009, que trata do Projeto de Lei de nº 150/09, que tem por escopo a alteração dos artigos 71, 74 e 75 da Lei nº 3.841, de 21 de dezembro de 2004, que dispõe sobre o Plano Diretor III do Município de Valinhos.

        Em breve síntese, afirma a referida mensagem que as alterações propostas visam o aperfeiçoamento da norma em “busca da manutenção do interesse público”, necessária para “proporcionar condições de vida com maior qualidade para os munícipes valinhenses, através de moradia, trabalho e laser e, aliado a essa premissa urbanística/social, arrecadar recursos financeiros para atender a demanda de serviços e obras públicas”. 

        Referida Mensagem trata também da alteração proposta pelo Projeto de Lei nº 151/09 e para tanto afirma que “é necessário continuar em busca de novas fontes de receita e da criação de empregos, sem descuidar do meio ambiente e da qualidade de vida já alcançada”, que a proposta de tornar zona agrícola em urbana, para o fomento da atividade de logística, a par dos municípios vizinhos de Vinhedo e Louveira, por não se tratar de atividade poluidora e encontrar-se em áreas improdutivas, não afetariam o meio ambiente.

        A primeira vista, nos parece que o texto da aludida Mensagem não guarda qualquer relação com as propostas que lhes seguem, senão vejamos:

        Ainda que a Mensagem faça menção à existência do interesse público, bem como de simples alterações da norma visando melhor adequá-la e simplifica-la, fato é que as alterações propostas são bastante significativas e parecem não atender somente àqueles interesses.

        É de interesse público a manutenção das normas que visam proteger o uso da água em nosso Município, inclusive para futuras gerações, bem como da permanência da zona rural agrícola, que presta não só para impedir o crescimento desordenado da cidade, como propiciar a continuidade de um cinturão verde, a proteger a zona urbana do município.

        É importante ressaltar que para se realizerem os princípios norteadores da Mensagem em voga, quais sejam, o respeito ao meio ambiente paralelo ao fomento das atividades empreendedoras visando o desenvolvimento social e econômico da cidade, NÃO É NECESSÁRIA a prática das alterações legais propostas pelo Poder Executivo.

        Fato é que a Política Pública deve não só manter como regulamentar os dispositivos legais urbanísticos, inclusive os consignados no Plano Diretor III e na Lei de Zoneamento e Uso e Ocupação do Solo, o que permitiria e estimularia  a ocupação de grande quantidade de imóveis ociosos na malha urbana da cidade, ao invés de induzir à drástica diminuição das zonas rurais ainda existentes em nosso município.

        O Poder Executivo pode sim manter o texto original das legislações em voga e, mesmo assim, não deixar de estimular a realização dos pretendidos e eventuais empreendimentos.

        Neste caso deverão os empreendedores se submeterem aos termos da lei em vigor, o que por certo aumentariam os seus custos, mas estariam longe de inviabilizar os seus lucros e a efetiva concretização dos empreendimentos.

        Não é demais lembrar que os artigos 74 e 75 do Plano Diretor III, amplamente discutido em passado recente por toda a sociedade, foram os que mais geraram polêmica quando de sua formulação e edição, contando inclusive com a contundente e vitoriosa participação dos chamados empreendedores, os proprietários das glebas de terras localizadas nas zonas rural turística e rural turística e de proteção e recuperação dos mananciais, que obtiveram, naquela ocasião, a inserção no texto legal em comento, a possibilidade legal de expansão urbana das suas propriedades.   

        Cabe pois ao Poder Público e a esta nobre Casa de Leis manter na íntegra os textos legais em exame, o que por certo,  em hipótese alguma inviabilizaria o interesse dos empreendedores e, mais importante, manter-se-iam assegurados os cuidados que tiveram os legisladores e a própria sociedade ao promoverem os Diplomas legais acima citados em passado bastante breve.

        Vejam os D. Vereadores que a mensagem do Poder Executivo  afirma que os Projetos de Lei foram precedidos de estudos específicos do seu órgão de planejamento, que estes foram apreciados por comissão especial composta por diversas pessoas do Poder Público, dentre elas o Diretor do Departamento de Trânsito e Operações de Valinhos, do Presidente do Departamento de Águas e Esgoto de Valinhos, mas não há  nos Projetos de Lei sob análise, nem mesmo nas respectivas Mensagens, nenhuma menção sobre as conseqüências e possibilidades  hidrológicas e financeiras decorrentes das pretensas alterações da lei, tal como a que trata da substituição dos padrões legais contido no artigo 74 da Lei 3.841/2004 por hipotético aporte financeiro de eventual e futura obra de captação.

        Também não há uma linha sobre “sistema viário” relacionado a verdadeira mudança de área rural para urbana sob a roupagem de logística, só para citar alguns exemplos.

        Ora, não restam dúvidas de que o proponente de tais alterações, ainda mais sendo o Poder Executivo seu feitor, deveria não só realizar como apresentar a toda a sociedade os “estudos” conclusivos e multidisciplinares de que levadas a efeitos as mudanças propostas com a retificação dos ditames legais, nenhum risco estaria sendo imposto à toda a coletividade, tais como escassez de água, super-população, malha rodoviária insuficiente, onerosa construção de infra-estrutura para o atendimento de novos bairros longe do centro urbano, em fim, flagrante diminuição da qualidade de vida dos munícipes e futuras gerações.

        Assim deveria ter procedido o proponente dos Projetos de Lei em análise pois, ao contrário do afirmado na mencionada Mensagem, os mesmos não tratam de mera adequação das normas – Plano Diretor e Lei de Zoneamento – mas de drásticas e importantes mudanças relacionadas ao uso do solo, profunda e flagrante supressão das obrigações relativas ao fornecimento de água em benefício de empreendedores, bem como a possibilidade de alteração de zona rural de aqüíferos em zona urbana sem a prévia e individualizada realização de estudos e relatórios de impacto ambiental.

        Portanto, não pensem os dignos vereadores, nem mesmo se deixem levar pelas palavras contidas na respectiva Mensagem 88/209, que o que está sendo proposto pelo Poder Executivo local é matéria não complexa e tem por escopo a simples “adequação das disposições  legais municipais de cunho urbanístico e ambiental em face do novo tratamento da matéria”, dado pela promulgação da Lei Federal nº 10.257, de 10 de julho de 2001, o Estatuto da Cidade.

        Muito ao contrário, como passaremos a analisar em seguida, as pretendidas alterações são de grande monta e dizem respeito a uma série de implicações de ordem legal, senão vejamos:

          
        DO PROJETO DE LEI Nº 150/09

        O artigo 3º do referido Projeto de Lei, que visa alterar o artigo 74 da Lei nº 3.841/2004, com o acréscimo de dois novos parágrafos não é somente paradoxal e até mesmo antagônico ao texto do artigo e seus parágrafos 1º; 2º e 3º, mas, a bem da verdade, faz tábula rasa e chega ao absurdo de revogar o prescrito no artigo 75, parágrafo 1º e seus incisos I, II e III.

        Ao propor a possibilidade de substituição de uma série de obrigações por aporte em dinheiro para obra de captação de água, opta-se por permitir que se troque o certo pelo incerto, o que não é permitido em matéria legal ambiental, muito menos sobre tema tão fundamental como  abastecimento de água para a população atual e futura.

        Trata, assim, a proposta de alteração da norma em vista, de profunda alteração da diretriz consignada no Plano Diretor III, que retira de uma só tacada, de toda a sociedade, a possibilidade de intervir sobre tal matéria – abastecimento de água – como decorre da exegese do próprio texto do “caput” do artigo 75 do aludido Plano Diretor, que impõe a realização de estudos por parte dos empreendedores – RAP, EIA e RIMA – estes certamente, em parte,  relacionados à produção da comprovação de atendimento aos requisitos e exigências legais contidas no artigo 74, inciso III, parágrafos 1º, 2º e 3º, da Lei nº3.841/04, que deverá ser objeto de apreciação não só dos órgãos competentes municipais como de toda a sociedade pelo instituto da Audiência Pública antes de tornar-se Projeto de Lei a ser encaminhado para o Poder Legislativo.

        A explicitada supressão, relativa a participação da sociedade se daria na medida que o texto da proposta de lei cria esta nova situação, qual seja, a discricionaridade do Poder Executivo Municipal, traduzida pela frase “a exclusivo critério do Poder Executivo Municipal”, que ensejaria a possibilidade de supressão de todas as prerrogativas contidas no texto original  que, como já visto, visam justamente a obrigação dos eventuais empreendedores,  para terem alterada a zona rural turística em zona de expansão urbana, de submeterem-se à uma série de exigências, em especial  relativas ao fornecimento de água, tanto para o próprio empreendimento como para o sistema público de abastecimento”.

        Ora, vingasse a proposta de alteração da lei em comento, passaria o Poder Executivo Municipal, a ter exclusivos poderes para, “alternativamente a produção de água estabelecida nos parágrafos 1º a 3º”  do artigo 74 do Plano Diretor, que prestariam para a garantia de toda a sociedade de que os empreendimentos naquela zona, se permitida a sua realização com a conseqüente alteração da legislação, assegurariam o abastecimento de água para consumo próprio e público,  de exigir, somente se entender necessário ou ao seu único critério, pois o texto da proposta é claro ao indicar o verbo “poderá” e não deverá “exigir do empreendedor aporte financeiro para o custeio parcial da futura obra de captação, adução, tratamento e distribuição de água do rio Atibaia..”

        Podendo o Poder Executivo, com exclusividade, fazer isso, significa dizer que poderia  ele, ao assim fazer, desconsiderar todas as prerrogativas contidas no artigo 74, III, parágrafos 1º à 3º, c/c com as dispostas no artigo 75, parágrafo 1º, incisos I, II e III, do Plano Diretor III,  o que não é admissível, muito menos razoável, pois os referidos dispositivos legais prestariam justamente para assegurar dentre outros direito do cidadão,  o abastecimento de água da geração atual e futuras, sob o crivo da participação popular, ao contrário do que propõe o onipresente Executivo, em flagrante desrespeito à diversas normas legais, dentre elas a Constituição Federal, o Estatuto da Cidade, a Lei Orgânica Municipal, os princípios gerais do Direito Ambiental e Urbanístico.

        Que interesse público há na referida proposta de alteração da lei, se a mesma contempla não só a supressão de uma série de obrigações legais dos empreendedores que desejam ver suas respectivas áreas rurais transformadas em de expansão urbana, mas também a própria impossibilidade da sociedade de participar da tomada de decisões ligadas à quantidade e qualidade da água para o abastecimento público ? 

        O artigo 4º do Projeto de Lei nº 150/09, visa a alteração do “caput” do artigo 75 da Lei nº 3.841/04 e acrescenta um novo parágrafo ao mesmo, tendo por escopo, segundo a respectiva Mensagem do Poder Executivo, a mera “simplificação de sua redação, tornando-se mais objetiva e direta, mantendo-se todas as exigências legais atualmente existentes, porém de forma mais eficaz e adequada, respeitando-se a supremacia do interesse público sobre o particular”.

        Ainda que pese o esforço hermenêutico do autor da mensagem, a proposta de alteração em voga, salvo melhor juízo, não contém nenhum dos adjetivos que lhe são atribuídos, muito menos, nos quer parecer, guarda qualquer relação com o dever do Poder Público com a supremacia do interesse da maioria.

        Infelizmente, também ao contrário do que afirma, não mantém as exigências legais atualmente previstas na norma legal objeto da modificação, senão vejamos:  

        Antes de mais nada, é preciso lembrar que as referidas Macrozonas, Rural Turística e Rural Turística e de Proteção e Recuperação dos Mananciais, são bastante extensas e comportam áreas com características muito diversas dentre de cada qual, com diferentes condições geológicas, hídricas, fauna, flora, dentre outros aspectos.

        Foi por esta razão que o legislador municipal e a própria população que participou da sua formatação, ao editar o Plano Diretor III, fez constar a exigência, no próprio artigo 75 em vista aqui, que cada interessado, ou seja, cada empreendedor ou empreendimento, para ser implantado nas referidas macrozonas, deveriam apresentar os seus individuais e singulares: Relatório de Impacto Ambiental, Estudo de Impacto Ambienta e Relatório de Impacto Ambiental, a serem objeto de análise dos órgãos do Poder Público e da sociedade para,  atendidos os requisitos legais, inclusive os contidos no Plano Diretor em voga, bem como as exigências de sua instalação, ser encaminhada projeto de lei para o Legislativo visando a alteração da zona rural para urbana, DAQUELE DETERMINADO ESPAÇO OU ÁREA onde seria realizado o empreendimento.

        Com a proposta do Poder Executivo, essas exigências, calcadas na apresentação dos referidos estudos ambientais, sofreriam duas radicais mudanças. A primeira delas consistiria na sua apresentação tão somente após a alteração da lei, ou seja, quando já tornada a área antes rural  em urbana, e a outra, tratando-se de empreendimento de natureza habitacional, tais como loteamentos e condomínios, os aludidos estudos somente seriam apresentados aos órgãos estaduais competentes, na forma da legislação estadual e federal vigentes.

        O Plano Diretor do Município é o instrumento básico do ordenamento urbano, cabendo aos munícipes o amplo direito de participação na sua realização e mudanças.

        A água é um bem comum e a preocupação com a sua escassez é notória quando se analisa o texto do Plano Diretor, em especial dos artigos 74 e 75 aqui comentados.

        O nome da macrozona em foco é “RURAL ... E DE PROTEÇÃO E RECUPERAÇÃO DOS MANANCIAIS”.

        Mananciais estes, há estudos sobre isso, responsáveis pelo fornecimento de grande percentual da água que abastece a cidade de Valinhos, sendo inclusive fundamental para a  manutenção do abastecimento de futuras gerações.

        Essas premissas impedem a alteração da lei, como proposto pelo Executivo. Ela traduz modificação que visa o menor conhecimento e portanto ineficaz participação da população sobre interesse que é maior seu, ou seja, a manutenção e a recuperação dos mananciais de água que abastecem o município diante da realização dos empreendimentos em áreas com tais características, pois os estudos ambientais pertinentes seriam realizados após a alteração da lei que possibilitaria aos mesmos edificar em padrões urbanos e, pior ainda, fornecidos para órgãos de esfera não municipal, distantes dos anseios e fiscalização da comunidade que aqui vive.

        Não há, portanto, qualquer fundamento que possa viabilizar ou tornar legítima a pretensão do Executivo de alterar a ordem das coisas, como disposta no texto original, a não ser o claro e evidente intuito de, em detrimento da segurança jurídica e dos direitos do cidadão comum valinhense, vir alterar zona de mananciais hídricos, responsáveis pelo abastecimento municipal,  em áreas de expansão urbana, sem os prévios e indispensáveis Estudos Ambientais, condição da comprovação da possibilidade de alteração da lei sem que se corra o risco de diminuição da quantidade e da qualidade da água.

        Para que ou para quem serviria tão drástica mudança da norma que visa o cuidado preventivo com a questão ambiental em Valinhos, por que, em se tratando de empreendimentos imobiliários/habitacionais, os estudos ambientais respectivos não mais seriam apreciados pelos órgãos e sociedade municipais, justamente os responsáveis e mais interessados no ordenamento da cidade ?

        Quer nos parecer, smj, que a alteração proposta pelo Executivo, além de inconstitucional, por ferir o disposto no artigo 37 da Magna Lei, não contém o princípio que alega ter, muito ao contrário, presta para enfraquecer e dificultar o exercício dos direitos do cidadão valinhense em contrapartida aos benefícios que seriam proporcionados aos empreendedores.

        Não bastasse isso, vejam os D. Vereadores que o texto da proposta é vago e defeituoso, mas contempla a expressão do seu verdadeiro espírito, qual seja:  “Para a viabilização da implantação de empreendimento nas Macrozonas Rural Turística e Rural Turística e de Proteção e Recuperação dos Mananciais é necessário:

I.    análise prévia de:

a.    áreas técnicas da Municipalidade; b. .... ....”

Pergunta-se: As áreas técnicas da Municipalidade, a Comissão Especial de Análise de Uso e Ocupação do Solo, os Conselhos Municipais de Desenvolvimento Urbano e de Meio Ambiente, irão analisar previamente o que ?

A audiência Pública contemplada no inciso II do artigo 75 da Lei alterada terá por objeto o que ?

Responde-se: A bem da verdade e do bem comum, deveria e só pode ser dos Estudos e Relatórios de Impacto Ambiental consolidados no texto original do referido “caput” do artigo 75 que de forma insólita, para dizer o mínimo, pretende o nobre proponente do projeto de lei em voga, sejam apenas apresentados posteriormente à edição de lei que torne urbana a área rural e de mananciais.

Não tem nenhum cabimento a pretensão contida no Projeto de Lei em análise e até mesmo cabe ressaltar a estranheza com o fato de que o mesmo tenha, como consignado em sua respectiva Mensagem, resultado de estudos e diversas reuniões dos órgãos da Administração Pública, bem como o condão ou objetivo de simplificar a redação e tornar mais objetiva a norma disposta no artigo 75 do Plano Diretor III.

Para a transformação da macrozona rural de mananciais para de expansão urbana e a conseqüente possibilidade de implantação de loteamentos na referida área ou zona de mananciais, para manter assegurado o direito do cidadão valinhense, é necessária a prévia apresentação de estudos ambientais e sua respectiva comprovação de que não se colocaria em risco a qualidade e quantidade de água para o abastecimento público.

Possibilitar que se torne área urbana sem os prévios e devidos estudos de impacto ambiental e sem o crivo da fiscalização dos seus munícipes, como propõe o Projeto de Lei em estudo, consistiria em flagrante e ilegal desrespeito de todas as normas e princípio legais que regem a matéria, inclusive os contidos no Estatuto da Cidade, consignado na Mensagem do Executivo.

É mais do que isso, pois possibilitaria aos empreendedores, tendo as suas áreas configuradas como de padrão urbano, sujeitar os seus respectivos estudos ambientais aos órgãos estaduais como incidentes sobre áreas não mais rurais, cujas exigências para a aprovação dos empreendimentos seriam, por isso, menos restritivos.

Ora, a intenção do legislador ao editar o Plano Diretor III e o referido artigo 75, não foi esta, muito ao contrário, estabeleceu uma série de requisitos e exigências para que fosse possível transformar áreas tão relevantes ambiental e hidricamente, em áreas de expansão urbana.      


DO PROJETO DE LEI Nº 151/09    

A Mensagem 89/2009 do Poder Executivo, que embasa o Projeto de Lei 151/09, afirma que “a medida proposta traz apenas medidas de aperfeiçoamento” da legislação em vigor, qual seja a Lei nº 4.186/2007, que dispõe sobre a ordenação do uso e ocupação do solo de Valinhos.

No entanto, tem ela por escopo transformar parte da zona rural agrícola em zona urbana, utilizando para tanto, como argumento principal a equiparação de locais encontrados em outros municípios – Louveira e Vinhedo  - em zona de predominância logísticas.

Diz a Mensagem ainda, que estas disposições normativas propostas contaram com o apoio da Associação dos moradores dos bairros do Macuco, Reforma Agrária e Capivari, por intermédio da AMARCA.

Propõe, pois, parcelamento mínimo de 50 mil m2 para atividades logísticas e de 5 mil m2 para zonas contíguas para atividades de apoio, tais como “atividades de lazer, educacional, hotelaria, hospedagem, lanchonete e restaurantes...”

Verificando-se o mapa da região ou macrozona rural de Valinhos, tem-se que, com a presente proposta de alteração da Lei, aproximadamente 1/3 da área rural trasnformar-se-á em área urbana!!

Nesta área urbana, com parcelamento mínimo de 5 mil m2, ao invés dos 20 mil m2 da área rural, poderá ser realizada atividades como de lazer (chácaras para veraneio, loteamentos com glebas de 5 mil m2), educacional e turística (hotelaria).

Vejam os d. Vereadores que as áreas de predominância logísticas, presentes na proposta, servem tão somente para justificar e tornar razoável a mudança de zona rural agrícola em zona urbana.

Não se pode entender de outra maneira, pois, para estabelecer ou fomentar a atividade de logística no Município e até mesmo em parte da zona agrícola, não seria necessário alterar a lei como proposto pelo Executivo, bastaria para tanto, por lei comum, implementar a possibilidade de num determinado raio ou distância a contar das rodovias que dão acesso à Viracopos, nunca superiror a 200 metros lineares, como é o caso das industrias na marginal da Rodovia Anhanguera, aqui mesmo em Valinhos, estabelecerem-se empresas com atividades logísticas.

Tanto é verdade que isso poderia ser feito, sem qualquer transformação de área rural em urbana, que a atividade de logística, na própria proposta do Executivo, ocuparia área mínima de 50 mil m2, portanto, bastante superior aos 20 mil m2 que consiste no parcelamento mínimo do solo rural.

Fosse a verdadeira intenção da proposta do Executivo fomentar as atividades de logísticas, as quais guardam estreita relação ou interesse com a áreas marginais e de fácil acesso às rodovias, a mesma não pretenderia INTERIORIZAR  as relativas áreas como faz a proposta, que chega ao absurdo de pretender transformar em área urbana com parcelamento mínimo de 5 mil m2, para apoio da logística, áreas que ficam a quilometros das rodovias, adentrando pelo interior da zona agrícola de Valinhos, onde há dezenas de produtores e atividades rurais e, pior, de difícil, precário e incompatível  acesso viário.

Portanto, quer nos parecer que a real intenção da proposta de alteração da lei é diversa e muito dissonante da que consta em sua respectiva Mensagem, tendo por fundo interesses outros que não o da grande maioria da população, de manter a macrozona em foco, na sua  íntegra, como área rural agrícola do Município de Valinhos.

Não se pode dizer que a proposta visa mero aperfeiçoamento da lei, quando na verdade pretende-se  transformar um terço da área rural agrícola em área urbana.

Da mesma forma, não se pode afirmar que a mencionada proposta conta com o apoio da associação dos moradores da região agrícola, mesmo porque,   sabe-se que há uma grande parte desses moradores, inclusive a sociedade organizada dos nipo-agricultores, que é veementemente contra a proposta do Executivo.

Não podem e muito menos devem os Dignos Vereadores acatar a proposta em voga, não só pelas razões acima expostas, como também pelo simples fato de que a mesma, levada a efeito, beneficiará um pequeno grupo ou até mesmo uma única pessoa, a que recentemente adquiriu as áreas objeto da pretensa alteração de zoneamento, cuja destinação e características são na sua totalidade rurais e agrícolas, importantes para a preservação do habitat e da área verde que ainda resta em nosso Município, portanto, em detrimento da importante manutenção da macrozona rural agrícola, para toda a comunidade Valinhense.

Não bastasse isso, fato é que a alteração da lei em voga não leva em consideração o texto da lei contido no Plano Diretor III, em especial o seu artigo 74, inciso II, letras “a” e “b”, que trata da macrozona  “rural agrícola”, que por força do seu conteúdo também deveria sofrer a equiparada adequação, não podendo restringir-se à alteração da norma que disciplina o uso e a  ocupação do solo prevista na Lei nº 4.186/07.

Assim sendo, não resta dúvida alguma de que a proposta fere, e de forma contundente e ilegal, os princípios contidos na norma original, quais sejam:

“Art. 74.... inciso II – Macrozona Rural Agrícola: área onde há interesse público em manter e promover atividades rurais e agrícolas.... com os seguintes parâmetros: estímulo à atividade agroturística que valorize a agricultura local, os atributos naturais,... culturais da região...”
 
CONCLUSÕES

A audiência pública havida na sede do Poder proponente dos Projetos de Lei contaram com expressiva participação popular, a qual foi bastante clara e incisiva no sentido de que as pretendidas alterações não fossem levadas adiante.

Não obstante tal fato, traduzido pela negativa da coletividade quanto ao prosseguimento dos projetos de lei, houve por bem a Administração local encaminha-los ao Legislativo.

Precisa ficar consignado que a exigência legal da realização das audiências públicas, não é mero requisito legal a ser atendido para a aprovação de alterações legislativas sobre temas urbanísticos e ambientais como quer fazer crer o Poder Executivo.

O seu desfecho, ou seja, o resultado das audiências públicas deve retratar o que nelas ficou patente, a aprovação ou a desaprovação da sociedade  diante do que fora proposto e objeto da própria.

No caso presente, não restariam dúvidas, a sociedade organizada de Valinhos manifestou-se de forma até veemente CONTRA a aprovação dos Projetos de Lei em voga.

Isso significa dizer que, desconsiderando a posição da sociedade, prosseguindo os atos desse legislativo no sentido de serem votados os aludidos Projetos de Lei, mesmo que realizada nova audiência pública, estaria o procedimento traçado pelas eventuais normas modificadoras do Plano Diretor III e da Lei nº 4.186/2007, desrespeitando de forma flagrante o previsto no artigo 182, incisos e parágrafo único da Lei Orgânica do Município de Valinhos, o qual dispõe que:

“Artigo 182 – São consideradas áreas de proteção permanente, e serão identificadas e delimitadas no Plano Diretor:

II – as nascentes, os mananciais e matas ciliares;
IV - as paisagens notáveis;
V – as estabelecidas em lei;

Parágrafo único – As áreas de proteção mencionadas no “caput”, somente poderão ser utilizadas na forma da lei, em concordância com a coletividade,  dentro das condições que assegurem a preservação do meio ambiente.”   

 Fere também o disposto na Lei nº 10.257/2001, denominada de “Estatuto da Cidade”, que ao regulamentar os artigos 182 e 183 da Constituição Federal, especialmente o contido no seu artigo 2º, inciso I, que determina:

Artigo 2º - A política urbana tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais da cidade e da propriedade urbana, mediante as seguintes diretrizes:

...II gestão democrática por meio da participação da população e de associações representativas dos vários segmentos da comunidade na formulação, execução e acompanhamentos de planos, programas e projetos de desenvolvimentos urbano.”

...VI – ordenação e controle do uso do solo, de forma a evitar

d) a instalação de empreendimentos ou atividades que possam funcionar como pólos geradores de tráfego, sem a previsão da infra estrutura correspondente”.

Os projetos de lei contém ainda outras espécies de vícios insanáveis, tais como a inexplicável e flagrante ausência de estudos que os embasem e os justifiquem tendo em conta o princípio legal contido no item IX do artigo 2º da supra citada Lei, que determina ser necessária a “justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do processo de urbanização”.

Também não guardam respeito aos princípios contidos no artigo 37 da Constituição Federal, que regem a gestão administrativa pública.
Pelo princípio da legalidade, pedra de toque do Estado de Direito, podemos afirmar que a Administração só pode atuar em consonância com a lei e, isso significa, não somente em conformidade com a norma jurídica aplicável a determinada situação mas, também e precipuamente, em conformidade com todos os ordenamentos jurídicos e via de conseqüência com os princípios constitucionais.

 Do princípio da impessoalidade decorre o dever do agente público de se conduzir, no trato da coisa pública (bem de uso comum do povo) de maneira imparcial e objetiva, devendo estar imune às ligações de cunho político e pessoal, tendo por único propósito o interesse público, que é a consecução do bem comum (aqui implícito o princípio da moralidade).

De todo o exposto também se afigura desrespeitado o princípio da eficiência, o qual impõe à Administração Pública o dever de ser sempre direcionada ao atendimento mais adequado e/ou eficaz possível do interesse público.

Sobre este tema merecem reprodução as palavras do Dr. MARINO PAZZAGLINI FILHO “in Revista de Direito Ambiental, ano 5, janeiro/março de 2000, Ed. Revista dos Tribunais, p. 114”:

“.... Denota que o agente público tem o dever jurídico de agir com eficácia real ou concreta. A sua conduta administrativa  deve se modelar pelo dever da boa administração, o que não quer dizer apenas obediência à lei e honestidade, mas também, à produtividade, profissionalismo e adequação técnica do exercício funcional à satisfação do interesse público.

A inserção na Constituição Federal da eficiência como princípio constitucional da administração pública, fundamental e expresso, não deixa margem a qualquer dúvida, de um lado, que é legítima, e mesmo necessária, a investigação ampla da eficiência das ações administrativas pelo Judiciário, e, de outro, que a atuação denominada discricionária do administrador é sempre relativa e especialmente limitada por este princípio.”

O Chefe do Poder Executivo Municipal afirma em suas Mensagens que foram feitos estudos pelos órgãos administrativos que ensejariam a proposição dos Projetos de Lei, mas, em momento algum apresentou os mesmos, o que por si só destaca a ausência da exigida eficiência da Administração Pública ao propor alterações tão drásticas e profundas como as objeto dos Projetos de Lei.

Ora, não é possível admitir a inobservância das normas e princípios legais, como bem pondera a sábia doutrina do Dr. Marino Pazzaglini Filho (ob. Cit. P. 115), “salienta-se que a atuação obrigatória dos agentes públicos incumbidos da tutela do meio ambiente é de duplo conteúdo, ou seja, positiva ou negativa. De conteúdo positivo, quando tem o dever de executar ações ou tarefas que assegurem, com efetividade, o meio ambiente sadio e equilibrado. De conteúdo negativo quando tem o agente público a obrigação de se abster de agir e zelar pela abstenção, por parte dos próprios organismos públicos e de terceiros, de ações nocivas aos bens ambientais”.

Por fim, destacam-se os ensinamentos do d. jurista acima citado, cujas palavras cabem como uma luva no presente caso:

“Assim, os agentes públicos, no exercício da tutela do meio ambiente, face ao comando específico das normas ambientais de prevenção, precaução e efetividade (art. 22, caput e parágrafo 1º da C.F.) e ao princípio universal da eficiência (art. 37, caput, da C.F), tem o dever jurídico de adotar e executar as medidas mais eficazes e produtivas para a satisfação do meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Enfim, o dever jurídico de boa gestão ambiental deve imperar sempre na atuação dos agentes públicos, não lhes cabendo, nesse aspecto, qualquer margem de discricionaridade. E a violação deste dever constitucional, além de implicar na reparação do dano ecológico causado, na responsabilidade civil do Estado perante os particulares lesados e na responsabilidade administrativa e, por vezes, penal do agente público responsável pela má gestão ambiental (Lei nº 9.605, de 12.02.98), pode ensejar a aplicação das sanções estabelecidas na Lei de Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429, de 02.06.1992).” (negritei).

Não obstante não sejam estáticas as questões pertinentes ao planejamento e desenvolvimento urbano do município, muito pelo contrário, estão sempre a merecer modificações e adequações no decorrer do tempo, estas devem sempre estar voltadas à consecução do bem comum  e à melhora da qualidade de vida do povo.

Segundo o princípio da razoabilidade, após a consecução do Plano Diretor, retrato do plano de desenvolvimento, zoneamento e ordenamento do território municipal, entende-se que para a sua alteração, também por lei, será indispensável a comprovação ou, no mínimo, a fundamentação técnica e sócio-econômica  que a justifique.

Em outras palavras, para que seja passível de mudança o ordenamento adotado pelo Plano Diretor e pela Lei de Uso e Ocupação do Solo Municipal, deverá haver razões e até mesmo necessidades, que tenham por objetivo a melhora da qualidade de vida da maioria da população, suficientemente capazes de tornar a pretendida alteração razoável e indispensável.

Ora, os Projetos de Lei 150/09 e 151/09 e suas respectivas Mensagens 88 e 89/2009 além de serem flagrantemente dissonantes entre si como restou demonstrado no decorrer desse trabalho, também não primam pela exigida consecução do bem comum e à melhoria da qualidade de vida do povo valinhense e, muito menos traduzem qualquer aspiração da comunidade/coletividade que as tornem razoáveis, necessárias e indispensáveis, não podendo deixar de ficar consignado que vêm desprovidos dos fundamentos e estudos técnicos que as justifiquem.

Contudo, por qualquer ângulo que se queira analisar a questão, devem ser rechaçados de pronto os Projetos de Lei enviados pelo Poder Executivo para esta nobre Casa de Leis, não sendo demais lembrar os Dignos Vereadores que levados adiante ou transformados em lei os preceitos legais contidos nos anteprojetos em voga estarão os mesmos cometendo equivoco de grande repercussão, sujeitando todos os agentes públicos envolvidos na sua aprovação, inclusive Vossas Senhorias, aos preceitos contidos na Lei de Improbidade Administrativa, nos mesmos moldes do que ocorrera no Município de Jundiaí, quando a Câmara Municipal daquela cidade, com açodamento, aprovou a mudança de zoneamento de áreas de mananciais e rural para urbana, beneficiando empreendedores locais,  o que ensejou a instauração de Inquérito Civil para a apuração de improbidade administrativa, resultando na anulação da referida legislação a posteriori. (vide matéria jornalística anexa).

Por fim, não é demais ressaltar que a audiência pública ocorrida no dia 23 de novembro de 2009, “consoante acordo celebrado com o representante do Ministério Público”, como consignado na Mensagem 88/2009 não traduz a verdadeira ocorrência dos fatos. É que o Poder Executivo de Valinhos tentou realizar uma audiência pública sem a devida, ampla e prévia comunicação à sociedade, a qual, por esses motivos,  fora  anulada e, em virtude disso, então com a ação do Ministério Público, se viu obrigado a realizar outra audiência pública, realizada com a supressão do texto da Proposta Original, que tratava também de implantação de Conjunto Habitacional no bairro São Bento.

Tais fatos servem para ilustrar a vontade ou desejo do Executivo Municipal frente às obrigações legais necessárias para a alteração da legislação em comento, dentre elas a de ter de submete-las à participação popular por meio de audiências públicas.

Derradeiramente, por todas as razões aqui expostas, é a presente para informar que a Comissão de Meio Ambiente da Subseção de Valinhos da Ordem dos Advogados do Brasil, é totalmente contra a forma e conteúdo das propostas de alteração do Plano Diretor III e da Lei de Uso e Ocupação do Solo, apresentadas pelo Executivo Municipal, razão pela qual sugerimos a esta Comissão de Sistematização da Câmara Municipal de Valinhos, responsável pelos estudos dos Projetos de Lei nºs 150/09 e 151/09, que, nos termos do inciso XX, do artigo 9º, da Lei Orgânica Municipal de Valinhos, seja, antes mesmo de realizada  audiência pública designada para o dia 03/05/2010,  por estes dignos Vereadores, vetada a iniciativa do Poder Executivo, consistente na pretensão de transformar em lei os anteprojetos aqui analisados.

Salvo melhor juízo, essas as nossas considerações, subscrevendo-nos, mui, Cordialmente.

Ordem dos Advogados do Brasil – 139ª Subseção de Valinhos/SP    
Presidente: Dr. Gilson Baione
OAB/SP nº 214.321


Presidente da Comissão de Meio Ambiente
Dr. Mauro Sergio Pinto da Costa.
OAB/SP nº 92.934

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