A viticultura praticada no Circuito das Frutas - SP chega aos dias de hoje construindo cenários desconfortantes, de um lado o viticultor deprimido e mal remunerado, de outro a pressão imobiliária e sérias questões ambientais a resolver. A viticultura do passado parecia mais eficiente por conta que o viticultor externalizava os custos ambientais, custos sociais, custos de formação profissional entre outros mais, e quando estes fatores finalmente foram enquadrados como encargos muitos viticultores aparentemente eficientes se mostraram totalmente inviáveis. No caso de Louveira - SP não foi diferente, cidade tradicionalmente produtora de uvas de mesa atualmente busca alternativas para redirecionar a viticultura municipal na tentativa de manter as atividades agrícolas num novo contexto onde a permanência da produção de uvas é chave para a preservação da qualidade de vida da cidade, e principalmente servir como atividade adequada para produção de água e proteção da biodiversidade local e atrativo turístico.
As bases de uma "nova viticultura" passam por valorizar a atividade agrícola como parte da economia da cidade que efetivamente pode sofrer readequação do uso e ocupação das terras gerando qualidade de vida e "bens ambientais" na forma de produtos universais de alta relevância como a água, o sequestro de carbono, a proteção da biodiversidade, a beleza cênica e alimentos saudáveis.
A proposta do Centro de Engenharia e Automação do IAC, para um modelo de gestão de uma "nova agricultura" foca a reconstrução de áreas que perderam a produtividade quando se tornaram urbanas, ou quando os níveis de degradação não permitiram viabilizar uma produção agrícola econômica. Esse novo modelo de uso das terras permite um melhor entendimento da importante prática de cobrir e proteger o solo, sempre intensificando a infiltração de águas para abastecer os aquíferos e mananciais de superfície, e simultaneamente evitando o assoreamento dos reservatórios. Essa "nova agricultura" permite o sequestro de carbono que a cidade tanto emite principalmente com o aumento de veículos circulando. Este modelo de desenvolvimento vai preservar a beleza cênica e dotar a cidade de um exclusivo circuito de paisagens, fruto da natureza e da ocupação pelo seu povo, e ainda vai fornecer alimentos saudáveis para ancorar uma necessária política municipal de segurança alimentar. Hoje a cidade não pode se dar ao luxo de abrir mão das áreas agrícolas e de seus fragmentos florestais para uma expansão urbana desordenada, que atende somente interesses de uma economia de lucro rápido e sacrifício da qualidade de vida. É fundamental a mobilização política para valorização da viticultura regional voltada para um investimento contínuo no desenvolvimento em escala humana. É necessária uma estratégia para viabilizar ações práticas de tornar "nosso futuro comum" mais claro e objetivo.
Para Louveira - SP trata-se de uma nova cultura para produzir uvas que não se fará por reformas ou novos métodos e conteúdos definidos por especialistas. É uma mudança radical, que deve tornar a viticultura capaz de:
a) atender às demandas da sociedade;
b) considerar as expectativas, potencialidades e necessidades dos viticultores;
c) criar espaço para que os munícipes e viticultores tenham autonomia para desenvolver o processo de redirecionamento da atividade de forma associativista, com trocas recíprocas, solidariedade e liberdade responsável;
d) fortalecer as capacidades dos viticultores em trabalhar em equipe, tomar decisões, comunicar-se com desenvoltura, formular e resolver problemas relacionados com situações contextuais;
e) desenvolver a habilidade de aprender a aprender, de forma que cada um possa reconstruir o conhecimento, inserindo na atividade as variáveis ambientais e sociais necessárias.
f) incorporar as novas tecnologias não apenas para expandir o lucro, mas principalmente para promover uma viticultura do futuro por meio da criação de ambientes que privilegiem a preservação ambiental, a qualidade de vida e independência financeira.
A "nova viticultura" ocorre por meio da interação e articulação entre conhecimentos de distintas áreas, a partir dos conhecimentos cotidianos característico do "circuito das frutas", das políticas publicas e das necessidades da cidade. Cabem as lideranças empreender ações e provocar a tomada de consciência sobre os conceitos implícitos numa "nova" forma de produzir um velho produto.
Por: Afonso Peche Filho - pesquisador científico do Instituto Agronômico de Campinas - IAC
Nenhum comentário:
Postar um comentário